quinta-feira, 7 de abril de 2011

Clausewitz: o emprego da doutrina do filósofo da guerra na gestão de riscos


Clausewitz: o emprego da doutrina do filósofo da guerra na gestão de riscos

Antonio Celso Ribeiro Brasiliano*
CLAUSEWITZ (1780-1831) foi um general prussiano cuja magnum opus, intitulada “Da Guerra”, teve como referencial histórico as Guerras Napoleônicas. Seu pensamento militar foi moldado pelas incessantes campanhas militares levadas a cabo pelo “Pequeno Corso” por toda a Europa ao longo de cerca de vinte anos.
A obra de Clausewitz foi escrita ao longo de mais de uma década, no início do século XIX, e só foi publicada em 1832, um ano após sua morte, por intercessão de amigos junto com Marie von Clausewitz, sua viúva. No entender de Clausewitz, seus escritos deveriam sofrer modificações antes de serem publicados, pois, segundo suas próprias declarações, só se encontrava satisfeito com o primeiro capítulo do volume I.
Conforme bem destacado pelo sociólogo e filósofo RAPORT (1976), Clausewitz absorveu a lição napoleônica de que a essência da política e do poder militar está na habilidade de se conseguir a destruição física do adversário.
Em outras palavras, Clausewitz, segundo RAPORT (1976), ao mesmo tempo em que rejeita a concepção da “guerra pela guerra”, afirma que ela – guerra – é parte integrante da existência humana, constituindo-se, portanto, num dos instrumentos necessários da Política. Este é, em essência, o real significado da sua célebre frase “a guerra é a continuação da política por outros meios”.
Clausewitz parte da premissa que a guerra não possuía regras fixas e que seus princípios não eram dogmas inflexíveis. Na realidade, seus conceitos são reflexões filosóficas sobre a condução da guerra.
Clausewitz ainda antevê a importância do contexto psicológico e social, no campo estratégico. Ao levar em consideração estes dois contextos, Clausewitz está sugerindo que a incerteza e o acaso sejam levados em consideração na tomada de decisão no campo de batalha. Outros fatores que não sejam só militares devem entrar na análise do comandante. Afirma ainda que a guerra é o reino do perigo. A guerra é o domínio do esforço e do sofrimento físico. Para poder resistir é preciso uma certa força física e moral que, inata ou adquirida, pode tornar indiferente a estes fatores. CLAUSEWITZ (1996) cita ainda: “Provido dessas qualidades e guiado pelo simples bom senso, um homem é já um bom instrumento de guerra… Se formos mais longe no que a guerra exige daqueles que ela se consagram, descobriremos que a qualificação intelectual ocupa o primeiro lugar. A guerra é o domínio da incerteza.”
Com isto Clausewitz quer dizer que mais de três quartos de ações militares permanecem em um nível de incerteza muito grande, ou seja, “nas brumas”. Enfatiza que para dominar a incerteza há a necessidade de uma inteligência sutil e penetrante, que o comandante possua instinto de poder visualizar as grandes variáveis que fazem parte do campo de batalha: o adversário, sua própria força, sua força moral, o terreno, as condições do tempo, os recursos empregados e com tudo isso a estratégia, a forma de enfrentar o inimigo.
A guerra é o domínio do acaso, nenhuma outra esfera de atividade deixa tanta margem a este desconhecido, nenhuma se encontra em tamanho nível de incerteza, sob todos estes pontos de vista. Em todas as circunstâncias a incerteza entra no curso dos acontecimentos.
No conceito da superioridade estratégica da defesa de Clausewitz o povo é o ator principal, pois é dele que emerge a força moral de uma nação. Neste caso o povo passa a ser tratado como o fundamento mais importante do poder nacional. Essas idéias conduziram a duas correntes antagônicas.
Na primeira, o povo pela sua reserva moral, sua força social e seus interesses próprios acabam por formar a trilogia povo, governo e forças armadas, de uma nação democrática. Na segunda, o povo ao subordinar seus interesses aos do estado constituiria a trilogia estado, governo e povo, dos regimes totalitários.
Não é por outra razão que no conceito estratégico de defesa, Clausewitz insiste em explicar a superioridade da defesa que advém do fato de que a nação deve ser defendida pelo soldado e pelo cidadão. Pela primeira vez o homem do povo se transforma num defensor da pátria em igualdade de importância com os soldados profissionais. Os atores fazem a diferença, são eles que intercedem no curso dos acontecimentos.
ABREU (2000), interpretando Clausewitz, sugere oito teses que mais influenciam a sua teoria de estratégia:
Primeira Tese: A existência do outro, que age e reage, tornando necessário analisar a vontade antagônica do outro ator;
Segunda Tese: Na guerra, apenas interessa o resultado final; “O significado do combate não reside no seu curso, mas no seu resultado e na sua importância”, CLAUSEWITZ (1996).
Terceira Tese: A formulação e a execução da estratégia não deverão estar nunca desligadas dos acontecimentos que vão ocorrendo no próprio campo de batalha, enquanto o confronto militar se desenrola.
Quarta Tese: Antes de tomarmos a decisão de fazer a guerra teremos que estabelecer com rigor a estratégia. A estratégia deve ser elaborada em função do adversário. Não dar o primeiro passo sem pensar no último.

Quinta Tese:
 Necessidade de escolher o quando, o onde e o com que recursos ir para a guerra.
Sexta Tese: Definir objetivos factíveis. Objetivos demasiado ambiciosos geram frustrações e inviabilizam o prosseguimento da missão estratégica.
Sétima Tese: A defesa não é mais que um meio para alcançar a vitória que torna capaz de tomar a ofensiva depois de conquistada a superioridade.
Oitava Tese: São três fatores que determinam a vitória na guerra: A violência, depois o acaso, a incerteza e o jogo das probabilidades, e finalmente a racionalidade que decorre da primazia do processo decisório. “A guerra, portanto, é mais que um camaleão, que vai modificando as suas características em função de cada caso concreto….. a violência inclui o ódio e hostilidade, é o impulso natural; o jogo do acaso e das probabilidades, que lhe confere o caráter da atividade criativa; e a racionalidade o domínio da razão pura”, CLAUSEWITZ (1996).
ABREU (2000) relata de forma contundente: “é que Clausewitz, com luminosa clarividência, identificou
alguns elementos constituintes da dinâmica não linear que caracteriza os sistemas caóticos
e complexos, incrustando-os no âmago do combate”.
Clausewitz determina os seguintes elementos para a elaboração de uma estratégia coerente e perfeita na guerra (BRASILIANO 2003):
“O primeiro elemento é o perfeito estudo de uma análise lógica da situação. Isto significa que deve haver uma relação de causa e efeito na ambiência, tanto do lado adversário quanto do próprio. O segundo elemento é estudar a compreensão histórica, buscar dados e fatos dos principais acontecimentos do passado, visando compreender o perfil da situação. O terceiro e quarto elementos são inter-relacionados, interligados: percepção psicológica e a visão sociológica.
Estes dois elementos significam o estudo da moral da nação, exército e comandantes do adversário, além de buscar entender qual o suporte e apoio que a população poderá fornecer para os exércitos em confronto.”
Foi a partir das campanhas napoleônicas que os exércitos de cidadãos surgem como estratégias
novas que produzem a morte gloriosa dos seus heróis e a volta triunfante dos soldados para suas atividades civis. Desse novo fato Clausewitz vai extrair os conceitos da batalha decisiva e do centro de gravidade das forças em luta que explicam as batalhas móveis e agressivas de sua época e as mais brilhantes estratégias de seu tempo. O centro de gravidade do inimigo pode ser avaliado pela importância que representa para a destruição do seu poder militar, político, econômico, territorial e moral. Destruição que se conseguida representa o colapso total da estrutura defensiva e ofensiva do inimigo. Deste conceito decorre o princípio da batalha decisiva, a qual não se situa necessariamente no campo militar nem inclui obrigatoriamente a destruição do exército inimigo, mas que pode ser vencida empregando meios dos outros campos do poder, juntamente com a sua expressão militar, para atingir os objetivos nacionais.

Conclusão

Podemos concluir, segundo os fundamentos da estratégia militar, que esta deve possuir as seguintes premissas:
a) a estratégia deve possuir como guia de decisão uma lógica, um entendimento do que acontece no todo para poder agir pontualmente;
b) a estratégia deve possuir um forte contexto psicológico e sociológico do meio ambiente, ou seja, não podemos ficar alheios as variáveis externas e quais serão suas influências;
c) a estratégia não pode ser rígida, deve ser flexível, adaptável ao meio ambiente, moldando-se de acordo com as curvas sinuosas de um rio;
d) o estrategista deve possuir muita criatividade, ou seja, embora possua uma estratégia, nunca deve ficar preso as suas premissas, deve sim ficar atento as possíveis mudanças e possuir agilidade suficiente para mudar, caso haja necessidade;
e) o estrategista deve avaliar o perfil de seu adversário, observando a moral e a intangibilidade da liderança, fator chave para a incerteza no campo de batalha.

Antonio Celso Ribeiro Brasiliano*

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